Análise Moons of Madness (PS4)
Moons of Madness se inspira no horror cósmico de Lovecraft para criar uma ficção científica em primeira pessoa excelente, mas se perde no seu próprio ritmo.
Transcrever ou adaptar a obra de H. P. Lovecraft não é uma tarefa fácil e mesmo assim, por conta da qualidade do material original, várias mídias tem tentado ao longo dos anos.
Só que adaptar um autor de sucesso não é garantia de alcançar a mesma admiração e é interessante observar como as obras que se destacam não são aquelas baseadas diretamente nos contos do escritor, mas sim nas interpretações de autores inspirados pelo tipo de horror criado por ele há quase 100 anos.
Jogos influenciados pela temática lovecraftiana como Bloodborne, Darkest Dungeon e Amnesia: The Dark Descent obtiveram tanto sucesso de público como de crítica, enquanto títulos mais recentes e fortemente baseados na cartilha do escritor americano, como Call of Cthulhu e The Sinking City receberam recepções mornas.
Muito dos problemas desses dois últimos títulos são devidos à sua jogabilidade e não por conta da história, o que evidencia que o balanço ideal para um bom game de horror cósmico reside no equilíbrio desses dois conceitos de para manter o jogador envolvido do início ao fim.
Moons of Madness consegue fazer esse balanceamento muito bem, mas se acrescentarmos o conceito de ritmo na equação a balança tende a pender para o lado que algumas pessoas podem achar menos atrativo: a repetição de tarefas mundanas para criar um senso de realismo.
E essa não é “defeito” exclusivo deste game, muitas pessoas criticaram esse mesmo tipo de mecânicas acessórias em Red Dead Redemption 2.
Em RDR 2 quando você morre em uma missão ao esquecer de pegar as suas armas na sela do cavalo é realista e imersivo, mas não exatamente divertido para todo mundo.
Cowboys do espaço
Não me entenda mal, adorei Red Dead Redemption 2, assim como gostei muito de Moons of Madness, e na minha opinião essas tarefas servem para construir o personagem e passar contextos muito importantes do seu papel nessa missão.
Conectar uma chave inglesa para fechar registros, usar descompreensão e regular os níveis de oxigênio em um ambiente ou mesmo tomar uma simples xícara de café são mecânicas com mais de uma etapa que considero brilhantemente inseridas para construção do nível básico de ações do seu personagem.
No final das contas depende do que o jogador espera dessa experiência, mas enxergo perfeitamente que para algumas pessoas o limite entre a imersão e excesso sejam um pouco menores que o meu e talvez para essa parcela do público o começo do jogo pareça um pouco arrastado.
Mas fique tranquilo, esse começo de construção e ambientação um pouco mais lento passa rápido quando os elementos de horror começam a aparecer, e quanto mais profundo no terreno da loucura Moons of Madness entra mais ele fica interessante e a sua ótima história brilha.
No espaço ninguém vai te ouvir gritar
Lançado em 21 de março de 2020 para Windows, Xbox One e PlayStation 4 Moons of Madness foi desenvolvido pela norueguesa Rocket Pocket Games e publicado pela Funcom, e para que todos possam aproveitar essa excelente história, o jogo está totalmente localizado e legendado em português do Brasil.
E como considero a narrativa um dos quatro pontos altos de Moons of Madness, vou explicar apenas o seu conceito básico para evitar spoilers.
O seu personagem se chama Shane Newehart e é um dos engenheiros em uma base espacial em Marte financiada por uma companhia privada chamada Oroch.
O objetivo da empresa com essa expedição é realizar estudos sobre o comportamento de plantas cultivadas e geneticamente modificadas para plantio em solo marciano, coleta de amostras de solo contendo possíveis traços de vida, além de outros estudos.
Mas Shane não está sozinho como Matt Damon estava no filme Perdido em Marte, a tripulação da base tem outros membros, mas como cada um tem atribuições diferentes o jogador inicialmente não tem contato com nenhum ser humano e toda a comunicação é feita através de rádio comunicação e e-mails.
E é através desses diálogos, ao acessar computadores espalhados pela estação, diários de bordo, explorando e observando cenários que a história é contada.
Se Moons of Madness fosse apenas um simulador de vida no espaço já seria um jogo excelente e completo. Tanto a base como os procedimentos são bem realistas e críveis, mas a trama começa a ficar mais densa quando coisas estranhas começam a acontecer na estação e você percebe que existe muito mais no planeta vermelho do que seus pesadelos jamais imaginariam.
E é aqui onde todas as influências lovecraftianas começam a aparecer.
Nesse ponto mais camadas de jogabilidade são adicionadas e o que antes era basicamente um walking simulator de exploração e resolução de quebra-cabeças se transforma em um survival horror bem interessante, mesmo que mais focado no quesito sobrevivência e menos na parte assustadora.
Insanidade e beleza aliados
Mencionei anteriormente que a história era um dos quatro pontos altos de Moons of Madness, e os outros três são justamente a jogabilidade quando o título adiciona as mecânicas de horror, os gráficos muito bem detalhados e excelente interpretação dos dubladores.
É maravilho observar os detalhes das reações de Shane quando a insanidade dos acontecimentos toma conta, uma animação que particularmente gostei muito acontecia quando ele precisava fugir de um perigo e logo após reabastecer o oxigênio do traje.
Normalmente essa é uma ação trivial que você já repetiu inúmeras vezes, mas que nesses momentos se torna imprecisa, desajeitada e agoniante e é por conta nessas pequenas diferenças que acho importante o início mais lento do game, justamente para evidenciar a diferença entre uma situação controlada e comum contra o desespero de estar lutando pela sua vida contra perigos desconhecidos e incompreensíveis.
E apesar de na maior parte do tempo o jogador precisar fugir ou utilizar furtividade, em alguns momentos Moons of Madness fornece ferramentas para combater esses perigos, desde formas simples como focar ou apontar sua lanterna para as criaturas até situações em que é possível partir para luta corpo a corpo.
Essa última alternativa é um tanto imprecisa e morri algumas vezes por culpa de como essa mecânica foi implementada e não por culpa minha, mas nada que prejudique a experiência, na minha opinião.
Já em relação ao visual Moons of Madness é perfeito, os detalhes da estação espacial e da superfície de Marte comunicam muito bem a sensação de solidão e isolamento, além de serem realistas e artisticamente lindos.
A iluminação, textura e efeitos de partícula são fantásticos tanto na parte “normal” do game como quando ele se transforma em um pesadelo, e como mencionei anteriormente esse poderia ser facilmente um simulador de rotinas espaciais, tal foi o cuidado com a ambientação.
Um complemento que contribui para que essa ambientação tenha uma qualidade tão alta é a dublagem.
Os atores fazem um trabalho de extrema qualidade ao transmitir com honestidade os diferentes sentimentos de cada momento e com certeza sem essa dublagem o game perderia bastante.
Ao infinito e além
Se você gosta de histórias de ficção científica bem desenvolvidas e horror espacial, mas não gosta de jogos muito assustadores, Moons of Madness é essencial para a sua coleção.
Não é um jogo longo, dependendo obviamente de não ficar preso em algum quebra-cabeça (eu fiquei um bom tempo em um, admito), sendo possível concluir a campanha em uma média de 7 a 8 horas, se você explorar bem e ler todos os textos em computadores, logs, etc.
Caso você seja um jogador mais direto talvez em 6 ou 7 horas seja possível apreciar essa excelente representação das muitas influências que H. P. Lovecraft imprimiu na cultura pulp como um todo e quem sabe conseguir manter a sua sanidade intacta.
A análise de Moons of Madness foi escrita com base em uma cópia de PS4 gentilmente cedida pela assessoria de imprensa do jogo.