Análise Help Will Come Tomorrow (PS4)
Help Will Come Tomorrow coloca o jogador na pele de sobreviventes de um acidente de trem em meio ao inverso Russo e cabe a você gerenciar recursos, conflitos e tentar fazer com que o máximo de pessoas chegue vivo ao final dessa jornada.
Jogos de sobrevivência e de gerenciamento de recursos nunca foram as minhas primeiras escolhas para passar o tempo, sempre preferi títulos de ação e aventura, RPGs medievais ou de fantasia ou ainda um game de tiro em que pudesse só desligar do mundo e passar raiva morrendo e sendo xingado por pré-adolescentes o tempo todo.
Mas de uns tempos para cá e muito por conta do meu trabalho aqui no Conversa, tenho cada vez dado mais chances a jogos que me colocam na pele de personagens que precisam sobreviver a condições adversas com poucos recursos.
E por mais tenso que a maioria desses games sejam, eu tenho gostado cada vez mais da experiência que eles têm me proporcionado.
Às vezes passo algum tempo do meu dia pensando em estratégias melhores para dividir recursos entre os sobreviventes, o que construir primeiro em outra jogada, quais áreas têm recursos valiosos e quais não ir por serem perigosas demais.
E muitas vezes estou pensando nisso quando não estou jogando.
Se pensar em um game mesmo quando não está efetivamente jogando ele não é sintoma de que você está ficando viciado em um determinado gênero eu não sei o que é.
E um desses jogos que tem me feito pensar muito sobre mesmo depois de terminar ele algumas vezes é Help Will Come Tomorrow.
Desenvolvido pelo estúdio polonês Arclight Creations, publicado pela Klabater e disponível para Nintendo Switch, PC, Xbox One e PlayStation 4, Help Will Come Tomorrow foi lançado em 21 de abril de 2020, dois meses e um dia depois de uma campanha curtíssima no Kickstarter que começou no final de fevereiro de 2020 e que em menos de duas semanas alcançou 100% de financiamento.
Infelizmente por conta do valor baixo pretendido pela campanha (12 mil dólares) não existiu meta para uma localização em português do Brasil, o que pode atrapalhar quem não tem um domínio bom de inglês já que o game é muito focado em história e texto.
E por falar em história, aqui temos uma em que eventos fictícios são inseridos dentro locais e período históricos reais.
Senta que lá vem história
A história de Help Will Come Tomorrow se passa durante a revolução Russa de 1917, e se você por acaso não se lembra muito bem das aulas de história eu te ajudo a colar nessa: em outubro os bolcheviques de Lênin iriam se rebelar contra o governo provisório e assim criar a primeira revolução comunista do século 20.
Essa parte histórica é importante para que o jogador entenda o contexto da desconfiança entre os personagens, já que nessa época a diferença entre as classes sociais era enorme e isso gerava conflitos constantes e os Russos eram na época um povo muito esquentado.
Mas independente da classe social ou convicção política na hora de lutar pela própria sobrevivência o ser humano às vezes precisa se unir ao que antes considerava como inimigos.
E é isso que acontece logo no início do game.
Um atentado ao Expresso Transiberiano faz com que quatro sobreviventes precisem organizar um acampamento e coletar recursos no meio do congelante inverno siberiano enquanto tentam vencer o clima, perigos naturais e os responsáveis pelo atentado, além das próprias diferenças ideológicas.
A jogabilidade de Help Will Come Tomorrow é relativamente simples e os tutorias são bons, mas o jogo é pouco intuitivo no começo e apesar de ser bem traduzido para o controle do PlayStation com certeza alguns comandos são mais orgânicos para a configuração mouse e teclado.
A região limitada do acampamento não tem capacidade suficiente para prover itens suficientes tanto para as construções como para a alimentação dos sobreviventes, então é preciso explorar o mapa para coletar esses recursos.
E é nesse ponto que as escolhas e o gerenciamento de recursos começam a ficar gradualmente mais importantes e vitais.
Decisões difíceis
No game os personagens têm um determinado número de pontos de ação, dependendo do seu estado físico e mental e da dificuldade escolhida, e é de acordo com esses pontos que o jogador pode ou não realizar as diversas ações necessárias do acampamento, como limpar a neve para conseguir fazer uma fogueira ou construir uma enfermaria improvisada.
Um personagem totalmente funcional começa o dia com 3 pontos disponíveis, mas a cada dois status negativos, como intoxicação, fome, frio, etc., um ponto é perdido no início do próximo dia.
E como esses pontos são consumidos em qualquer ação, até as mais simples, você tem que escolher o que é mais importante naquele momento específico.
Se construir o sistema de filtragem de água do acampamento não vai ser preciso ir ao rio coletar água, por outro lado se gastar todos os pontos para isso não vai conseguir sair do acampamento para coletar comida e outros materiais para melhorar as suas construções.
Outro detalhe, a maioria das construções incentivam o trabalho em conjunto de dois sobreviventes, por exemplo, para construir uma tenda de descanso para que os personagens se protejam do frio e se recuperem da fadiga são gastos 3 pontos, mas se duas pessoas trabalharem juntas é gasto apenas 1 ponto de cada.
O ciclo de gameplay é dividido entre dia e noite e o jogador pode terminar o dia a hora que quiser.
Durante o dia é feito o gerenciamento de recursos, exploração, construções, o tratamento dos doentes e a divisão de comida e água, já a parte social de gerenciamento dos ânimos e história é feito durante as noites em conversas em volta da fogueira.
É preciso ficar atento as relações entre os personagens ou eles vão criar animosidades e picuinhas entre si e acentuar ainda mais suas diferenças, isso não é nada bom já que precisam trabalhar juntos para sobreviver e duplas que não se dão bem diminuem a barra de moral do acampamento o que leva a um consumo maior de recursos.
Além disso cada personagem tem características distintas que vão sendo reveladas aos longo dos papos noturnos. Algumas características podem ser positivas, como maior resistência ao comer algo que faria mal para outro personagem, ou negativas, como menos resistência à desidratação.
E é durante as conversas em volta da fogueira que o jogador aceita as missões secundárias que podem ser realizadas nos próximos dias.
Essas missões são sempre de exploração, mas algumas demandam mais de uma etapa para serem concluídas, o que aumenta os riscos, mas também as recompensas.
A mapa se abre a medida que você vai explorando e funciona em grades, cada região tem uma determinada dificuldade de acordo com os perigos da área e alguns tipos específicos de recursos disponíveis.
Por exemplo, uma determinada área pode ter uma quantidade boa de comida, mas pouca madeira e tecido, ou vice-versa.
A medida que se afasta do acampamento com uma expedição ou dependendo do clima, maiores serão as chances dessa expedição se perder ou ser atacada por bandidos e animais. O meio termo é explorar até que a barra de probabilidade de ser perder esteja dentro de um limite aceitável ou se os pontos de ação estiverem zerados.
Expedições perdidas só retornam ao acampamento no outro dia e não participam das conversas daquela noite, além de ficarem expostas aos perigos da natureza selvagem e quase sempre quando retornam precisam de atendimento médico imediato, o que mais uma vez demanda recursos escassos.
Além disso o seu acampamento pode ser soterrado, o que é resolvido facilmente apenas removendo o excesso de neve, ou ter suas estruturas completamente destruídas pela nevasca, o que obriga o jogador a construir novamente gastando preciosos recursos (que raiva, meu amigo).
Essas condições deixam o jogador sempre na beirada da cadeira e até nas dificuldades mais baixas é comum após alguns dias alguns personagem morrerem dependendo da quantidades de status negativos que eles adquirirem ou se você simplesmente não tinha comida para todos e não viu a saúde deles diminuir gradualmente.
E se por um lado a morte signifique menos bocas para alimentar também significa menos pontos de ação para as tarefas essenciais como retirar neve, filtrar água, cozinhar, cuidar uns dos outros, etc.
Esse jogo é para mim?
Depende muito do seu estilo como jogador e tenho várias considerações e convido você leitor a avaliar se esses fatores vão te fazer ter interesse no título ou não.
Como gerenciador ele é maravilhoso, são muitas as variáveis que é preciso estar atento (e eu nem citei todas para não ficar um texto gigante) e a interdependência entre os diferentes status são simples porém muito efetivos e inteligentes.
Mas Help Will Come Tomorrow pode ser considerado muito parado para alguns jogadores.
Os personagens não tem animações complexas que mostram eles construindo as coisas, também não existem diálogos dublados e a exploração do mapa consiste basicamente em uma tela estática em que o jogador só vê o tabuleiro do mapa, indica qual quadrante quer explorar e com um botão extrai o que precisa dele, ou seja, você não visita a região efetivamente, o que já ajudaria a dar uma variada nos cenários e um sentimento de ação.
Os encontros com inimigos e animais selvagens são apenas ações contextuais apresentados através de textos em que você pode escolher as ações que quer tomar, sem existir então um combate de verdade.
A estilo artístico do jogo é bonito e a história tem uma profundidade maior do que inicialmente é apresentado, principalmente quando a história de cada pessoa começa a ser revelada, além da representação das lutas de classe e período histórico serem excelentes.
A trilha sonora é boa, porém muito repetitiva e a impressão é que existe apenas o tema principal e que ele fica se tocando infinitamente.
A duração depende de quantos dias você conseguir sobreviver, mas ao menos na minha experiência as minhas várias jogadas duravam em média de uma a duas horas.
Na primeira campanha consegui sobreviver até o 9° dia, na segunda cheguei ao dia 14, e depois até o dia 19 e a última fracassada até o dia 21.
Para que o jogador consiga sobreviver é preciso que ao menos um dos personagens esteja vivo no 25° dia, o que não é fácil, já que existe além de todas as adversidades ainda exista o elemento sorte atrelado à exploração visto que os recursos, personagens, encontros e missões são gerados ao acaso.
Apesar dessas considerações e considerando a proposta, preço e escopo do jogo, eu particularmente gostei e achei Help Will Come Tomorrow bem interessante.
E se esse review não foi suficiente para despertar o seu interesse, ou se ficou em dúvida de como tudo isso funciona, quem sabe você não queira checar um resumo de um dos meus playthrough do jogo disponível no canal do YouTube do Conversa de Sofá e ter uma visão mais gráfica das mecânicas citadas aqui.
Aproveite e se inscreva lá que sempre tem vídeo novo saindo de diversos jogos que depois se tornarão análises aqui.
A análise de Help Will Come Tomorrow foi escrita com base em uma cópia de PlayStation 4 gentilmente cedida pela assessoria de imprensa do jogo.