Análise Space Otter Charlie (PS4)
Space Otter Charlie é um jogo de plataforma em gravidade zero que surpreende pela jogabilidade, porém problemas técnicos atrapalham a experiência final.
Espaço. A fronteira final.
Estas são as viagens da nave estelar Raft, em sua missão de dez horas para explorar novas áreas, coletar recursos e salvar a vida animal da Terra. Audaciosamente indo aonde nenhuma lontra jamais esteve. Oi? Lontra? Como assim?
Se você entendeu essa referência à Star Trek parabéns, existem chances de a) você já ter passado um pouquinho dos 30 (ou muito), como eu, ou b) ser uma pessoa com ótimas referências e um tantinho de cultura inútil acumulada no fundo da cachola. Talvez você se encaixe nas duas categorias, e aí poderemos ser amigos à partir de agora.
E sim, você não leu errado, Space Otter Charlie trata das aventuras de uma equipe de lontras que no ano 2500, após humanos abandonarem nosso planeta por conta do aquecimento global, desenvolvem um programa espacial para explorar a galáxia a procura de um novo lar para os animais que ficaram abandonados na Terra.
Desenvolvido pela Wayward Distractions e publicado pela The Quantum Astrophysicists Guild (palmas para o excelente nome), Space Otter Charlie foi lançado em 18 de março de 2021 e está disponível para Nintendo Switch, PlayStation 4, Microsoft Windows, Linux, Mac OS e Xbox One.
Infelizmente o jogo não conta com localização em português, o que é parcialmente compreensível por se tratar de um estúdio independente, mas por conta de existirem oito idiomas para escolha, inclusive de mercados consumidores menores que o brasileiro, esse ponto deixa a desejar. Contudo, visto que a história não se aprofunda além do apresentado nas cutscenes iniciais, e por conta dos textos durante as fases serem bem simples, mesmo não dominando outras línguas é possível entender facilmente seus objetivos.
O que se perde com essa falta de tradução é o bom humor do título, que aposta pesado em trocadilhos (que talvez fossem difíceis de serem localizados), e os logs de texto, colecionáveis com informações sobre os locais visitados ou fatos curiosos sobre os mustelídeos, bem aos moldes do que era apresentado nas figurinhas dos Chocolates Surpresa da Nestlé.
Flutuando no espaço
Além da história, a jogabilidade e os objetivos de Space Otter Charlie são simples: você explora estações espaciais e laboratórios abandonados a procura de recursos para melhorar sua nave e o seu personagem, enfrenta inimigos, atravessa obstáculos e armadilhas espalhados pelos cenários e ao final de cada uma das fases principais enfrenta um Chefe. Essas batalhas são interessantes e entender como explorar a fraqueza de cada um deles funciona quase como um quebra-cabeças, que vai desafiar o que o jogador aprendeu até o momento.
Apesar disso, o grande destaque é a própria movimentação de Charlie. Usar a mochila à jato para se deslocar na gravidade zero é incrivelmente satisfatório, e muitas vezes a impressão é que estamos nadando no espaço sideral, um sentimento bem adequado, visto que lontras são animais aquáticos e não roedores (como aprendi no jogo, inclusive).
Ao saltar em uma direção, Charlie segue nela até encontrar um obstáculo ou plataforma onde pode aterrizar com suas botas anti-gravidade, que grudam em qualquer superfície. Dessa forma, a mochila à jato funciona como um direcionador que pode ser usado para aumentar sua velocidade ou para mudar a direção do movimento no meio da ação e, nesse caso, o desafio fica por conta da quantidade limitada de combustível do dispositivo. Ficar sem ele no meio de uma batalha significa não ter impulso suficiente para desviar de um ataque ou de um obstáculo eminente. E não se engane, controlar essa funcionalidade entra na categoria: fácil de jogar, difícil de masterizar.
Space Otter Charlie é classificado como um game de plataforma, mas como ele funciona em todas as direções e eixos por conta da gravidade zero, isso acaba retirando o desafio clássico de games do estilo, como distâncias que não podem ser superadas sem pulo duplo ou algum power-up, por exemplo, mas acrescenta outros dificultadores referentes à própria movimentação, como atravessar um túnel sem encostar nas paredes de lava de um asteroide, enquanto coleta mais combustível e aciona botões para abrir portas, para citar um dos cenários que mais tive dificuldade.
Além disso, o título combina características de shooters, quebra-cabeças com leves influências de metroidvanias e RPGs para compor o seu estilo de jogabilidade.
Durante a exploração você encontra plantas esquemáticas para construir novos trajes, upgrades para as três armas básicas, aumento de vida e capacidade do seu jetpack, além de mapas para áreas secundárias. A variedade de armas, inimigos e os diferentes perigos de cada área são um ponto alto que gostei bastante. Os trajes, além da função estética, incorporam armas temáticas ao seu arsenal como, por exemplo, o de tubarão que tem uma pistola que atira três pequenos tubarõezinhos ou a roupa cibernética em que o tiro é um soco gigante.
Existe uma função para recrutar tripulantes para a nave usando as células de energia coletadas nas fases, mas que acredito ter sido muito mal aproveitada, já que ela não acrescenta nada no gameplay.
Quando vi que poderia ter na minha equipe uma baleia especialista em provisões achei que em algum momento comida poderia ser um fator importante e que traria profundidade ou características de sobrevivência a Space Otter Charlie, mas infelizmente não. Essa é uma mecânica meramente figurativa e a recompensa são algumas linhas de diálogo com o novo recruta e, para os platinadores de plantão, um troféu ao resgatar todos.
Existe uma função narrativa para isso, afinal o objetivo final da equipe de mustelídeos astronautas é resgatar os animais que ficaram na Terra, mas sinceramente não achei esse um incentivo tão bom. Uma alternativa para dar importância a essa ação poderiam ser bônus passivos a cada sobrevivente especialista resgatado, mas talvez essa fosse uma função muito difícil de ser implementada considerando o escopo do jogo.
Vale a pena?
O visual simples de Space Otter Charlie me deu a impressão errada de que ele seria um jogo bem genérico, mas essa simplicidade inicial caiu por terra assim que o iniciei. O ritmo da jogabilidade é realmente incrível e é muito satisfatório controlar Charlie em gravidade zero, além das já mencionadas variedades de armas, cenários e inimigos ser muito boa.
Quem gosta de multiplayer existem dois modos locais para até quatro jogadores: uma competição que vence quem comer mais ouriços do mar (que funcionam como power-ups durante a campanha) e um estilo mata-mata, que vence quem matar mais durante um espaço de tempo. Esses modos podem aumentar a vida útil do jogo, e apesar limitados e simples são bem divertidos.
Seria uma recomendação fácil para quem gosta de jogos de plataforma, mas os problemas de performance e leves travamentos a cada vez que o game salva (e ele salva quase toda hora) ou quando existem muito inimigos na tela faz com que a experiência final sofra bastante.
Nos primeiros cenários esse problema não é tão grande, mas gradualmente quando a complexidade e tamanho das áreas aumenta se torna bastante incômodo e realmente atrapalha toda a fluidez do jogo. A última fase inteira e luta com o Chefe final são um show de horrores nesse ponto, pelo menos no PlayStation 4, onde avaliei ele para este review.
Obviamente isso é algo que pode ser resolvido através de uma atualização que melhore a performance, mas nesse momento, mesmo que você tenha se interessado por tudo que escrevi até aqui, a minha recomendação é esperar um update ou uma boa promoção.
A análise de Space Otter Charlie foi escrita com base em uma cópia de PlayStation 4 gentilmente cedida pela assessoria de imprensa do jogo.