Análise Anna’s Quest (PS4)
Anna’s Quest é um conto de fadas moderno. Lindíssimo, engraçado, intuitivo e com uma história excelente, cheia de reviravoltas.
Se eu não soubesse que Anna’s Quest é um adventure point and click moderno e me dissessem que ele é um jogo da LucasArts que ficou perdido nos arquivos da empresa e só viu a luz do dia agora, eu acreditaria na hora, tamanha a qualidade visual e narrativa do título. E isso para um game do gênero é um elogio e tanto.
E apesar do elogio poder se transformar em uma maldição em um estalar de dedos, quando comparações e referências em excesso podem limitar a criatividade, o trunfo de Anna’s Quest reside justamente em não ser um caça-níquéis nostálgico. Ele tem claros acenos aos titãs do gênero, mas tem sua própria identidade, humor, ritmo e uma história incrível, que evolui bastante ao longo da jornada de Anna.
Essa evolução narrativa pode ser comparada à própria trajetória do desenvolvimento do game, lançado inicialmente em 2012, pela Krams Design como Anna’s Quest Vol. 1: Winfriede’s Tower. Contendo dois capítulos, com planos de lançamentos futuros dos demais, esse pequeno trecho recebeu muitos elogios, tanto de público como de crítica, a ponto do desenvolvedor, então totalmente independente, ser procurado pela Daedalic Entertainment para uma parceria na finalização e publicação do projeto.
Dessa forma, com esse suporte Anna’s Quest foi lançado para computadores em 2015. E a recepção foi ainda mais positiva dessa vez, agora como produto completo. Contudo, quem não joga em PC teve que esperar até 2021 para que o título tivesse seus controles adaptados para consoles, e fosse então lançado para Nintendo Switch, Xbox One e PlayStation 4 (onde joguei para este review).
Mas antes de mais nada, sobre o que é o game?
Anna’s Quest é um conto de fadas moderno. A sua história original, cheia de reviravoltas, faz parecer que estamos jogando uma das obras dos Irmãos Grimm ou de Perrault.
Minha impressão inicial foi que o game seria voltado para o público infantil, e por mais que isso seja verdade em uma camada superficial (afinal a classificação indicativa dele é livre para todos as audiências), em uma análise mais profunda, em suas estrelinhas ele aborda assuntos mais pesados e usa um senso de humor ácido e sarcástico, que só os mais velhos perceberão.
Assim como em um conto de fadas, para as crianças tudo não passa de uma aventura, mas no fundo o cautionary tale é um alerta para perigos que a inocência não permite entender perfeitamente.
Sem entrar em muitos detalhes, já que os plot twists são a alma do jogo, a história é sobre a vida de Anna, que mora sozinha com o seu avô em uma casa isolada, ao lado de uma floresta. Anna tem uma infância feliz, mas é super protegida pelo avô, que não permite que ela vá para muito além do quintal de casa, principalmente à noite.
Contudo, como em toda jornada do herói o chamamento à aventura chega, e aqui o avô de Anna é acometido por uma doença misteriosa que faz com que ela precise atravessar a tal floresta em busca de ajuda. Entretanto, a bruxa Winfriede tem outros planos para a garota e a aprisiona em sua torre. Lá, ela busca através de experimentos aflorar uma capacidade mágica que Anna tem: a telecinese, para, claro, depois extrair esse poder da menina para si.
Mas, assim como os vilões de Chapolin, ela não contava com a astúcia de Anna, que consegue se libertar e fugir de suas garras. Dessa forma, e com a ajuda de um ursinho de pelúcia encantado chamado Ben, Anna embarca de verdade na sua missão para garantir que seu avô seja curado. Uma missão que ainda terá vários desvios no caminho.
Ao longo da jornada ela vai encontrar vários personagens com os mais variados problemas, e cada um que Anna ajudar faz com que ela fique mais perto do seu objetivo. Como a história de Anna’s Quest é bem guiada, essas missões, que seriam consideradas secundárias em outros jogos, aqui se tornam obrigatórias. E todas são ótimas, esclarecendo um pouco mais sobre a trama do game a cada esquina.
Na sua caminhada Anna e Ben vão encontrar Dragões, Ogros, Bruxas, Fantasmas, Bandidos, Magos, Raposas Falantes e o próprio Diabo, além de um número expressivo de outros personagens, todos com diálogos muito bem dublados em inglês. Um trabalho executado de forma excepcional, que em conjunto com a trilha sonora dão personalidade e contribuem muito para transformar essa história em um dos melhores point and clicks que joguei recentemente.
Carregado de humor, com objetivos e quebra-cabeças relativamente simples, o jogo é uma ótima entrada no gênero ou para quem não tem costume com adventures. Eventualmente, algumas soluções podem exigir, como todo game do estilo, um pensamento um pouco menos convencional, para entender quais itens são necessários para a progressão em um determinado local, ou com quem falar para obter a informação necessária naquele momento. Anna inclusive faz diversos comentários quando você tenta usar um item, dando dicas leves de que direção seguir, mas sem insultar o jogador colocando a solução na sua cara.
De toda forma, se algum puzzle for mais exigente ou te colocar em um beco sem saída, é possível pular direto para a solução se quiser. Mas fica o aviso para quem gosta de colecionar troféus, como eu: não completar um determinado quebra-cabeças faz com que o troféu relacionado a ele seja perdido.
No quesito jogabilidade, a adaptação dos controles para os consoles ficou ótima. É fácil controlar Anna, manipular e combinar os itens do inventário, etc. Além disso, um indicador de objetos com que o jogador pode interagir elimina a necessidade de pixel hunt, que, inclusive, foi um dos pontos que mais critiquei no meu review de Beautiful Desolation aqui para o Conversa.
A arte do game, que você pôde acompanhar ao longo desse review através das imagens que inseri no post, falam por si só. Lindamente desenhada a mão, o seu 2D evoca a lembrança da era de ouro da LucasArts, que mencionei no início desse texto. Os cenários bem detalhados são interessantes, e os modelos dos personagens são distintos e cheios de personalidade. O único que não gostei de verdade foi o da própria Anna, que poderia ter mais detalhes, principalmente nos olhos. Mas aí talvez seja chatisse minha mesmo.
Anna’s Quest seria uma recomendação fácil para crianças, adolescentes e adultos que amam uma boa história ou gostam do gênero adventure point and click, mas existe um porém. E ele é um que pode ser decisivo para que muitas pessoas não se interessem pelo título: o jogo está todo em inglês. Sem legendas em português é difícil para quem não domina outra língua, principalmente considerando o quão dependente de história ele é, embarcar nessa aventura surpreendente.
Mas se a barreira do idioma não é um impedimento, a pergunta que fica no ar é: “Está esperando o quê!?” A aventura não vai começar sem você!
A análise de Anna’s Quest foi escrita com base em uma cópia de PlayStation 4 gentilmente cedida pela assessoria de imprensa do game.