Análise Clid The Snail (PS4)
Controle um caracol ranziza e pronto para a guerra em Clid The Snail, um twin-stick shooter com ambientação única e história melhor ainda.
Já analisei diversos twin-stick shooters aqui para o Conversa, como West of Dead, Ruiner, Darksiders Genesis, dentre outros, mas nenhum tinha um personagem tão inusitado como o herói de Clid The Snail. Afinal não é todo dia que você tem oportunidade de jogar com um caracol armado com um verdadeiro arsenal ambulante. E, claro, não deixei essa oportunidade passar quando o game chegou aqui na redação.
Inclusive, herói talvez seja uma palavra muito forte, pelo menos no começo do jogo. Clid é ranzinza, beberrão e o seu amor por confusão, e armas, acaba colocando ele em maus lençóis. Tanto que o game começa com ele sendo expulso de sua tribo e se tornando um exilado. Entregue a um mundo devastado pela Praga das Lesmas, que transforma os animais em seres hostis, Clid agora terá que se virar para sobreviver.
Felizmente ele não está sozinho. Ao seu lado ele tem Belu, um vaga-lume que é a voz da razão da dupla e vítima de todo o mau humor e piadas sem noção de Clid, além claro, de contar com seu bom e velho rifle laser (com munição infinita), usado para explodir os inimigos em mil pedaços.
Além dessa arma padrão, após um determinado acontecimento logo no início da história, Clid é acolhido por um grupo de renegados mercenários, que irão fornecer a ele, por um preço em dinheiro e em troca de serviços prestados, uma variedade de outros tipos de armamento, novas carapaças (afinal, ele é um caracol) e itens consumíveis, como kits médicos, minas de proximidade, granadas, etc.
É na base de Alastor que Clid encontra Cassius, o camaleão; Haelsy, a morcega; Atxaka, a tartaruga; Itako, o sapo e Morti, o porco-espinho. Fiz questão de nomear um por um, porque eles são muito importantes para a história. Cada um desses personagens também foi exilado pelos seus próprios povos por diferentes motivos, e hoje vivem da venda das suas habilidades em combate para as diversas tribos desse mundo na luta contra a Praga.
A jogabilidade segue um caminho bem padrão do gênero: com um analógico é feito o controle da movimentação e com o outro a mira; o cenário é visto de cima, em visão isométrica, com câmera fixa que acompanha o personagem; os inimigos flanqueiam por todos os lados e é necessário constante movimento.
As novas armas e carapaças que Clid pode comprar na base fazem toda a diferença para dar mais dinamismo ao combate, além de muitas serem necessárias na resolução dos diversos puzzles espalhados em cada cenário. Eu, por exemplo, fiquei um bom tempo vagando sem sorte em uma área tentando entender como um dos quebra-cabeças funcionaria, até que usei meu lança-chamas para aquecer um cristal e mudar a direção de um laser e eureka! era isso que faltava o tempo todo.
E durante as lutas, mesmo que você consiga se virar muito bem com o rifle a laser na maioria das vezes, nas batalhas contra os Chefes ou determinados inimigos mais fortes é vital variar essas armas até encontrar a que será mais eficiente para aquele momento, cada uma com suas vantagens e desvantagens.
O rifle, por exemplo, tem munição infinita, mas os disparos normais não são causam tanto dano, já o tiro forte, que pulveriza os inimigos mais fracos, demora um pouco para ser carregado. As demais armas, como a shotgun, arma de raios, metralhadora de veneno e outras, tem munição finita e diferentes alcances e eficiências dependendo do alvo.
Testar novas carapaças/armaduras é um bom negócio para testar com qual você vai se adaptar. Uma delas dispara mísseis quando o especial é carregado, outra solta raios em uma área, enquanto uma terceira tem um escudo de invencibilidade, por exemplo. Em alguns dos Chefes inclusive, é praticamente mandatório utilizar todo esse arsenal para sobreviver.
Clid The Snail não tem um seletor de dificuldade, mas é um jogo relativamente fácil em grande parte da sua duração. Diferente de muitos twin-stick shooters que se apoiam em uma quantidade absurda de inimigos por tela para inflar esse parâmetro, aqui a aposta é na variedade desses inimigos.
No máximo você vai enfrentar 5 ou 6 inimigos por vez, mas normalmente cada um terá um diferencial, seja uma armadura mais pesada e resistente, passando por inimigos com escudos, outros que explodem, enquanto alguns podem conjurar magias e se teleportar na arena. Isso faz com que o jogador precise se planejar melhor em combate e não só disparar para todo lado. Clid também pode usar uma corrida rápida ou um rolamento para se ver livre de algumas situações, contudo, essas duas ações usam de uma barra de estamina, que é pequena e de carregamento lento. Use com sabedoria.
Entretanto, essa quantidade limitada de inimigos permite uma certa margem de erro, que pode ser ajustada durante as lutas sem você sentir que está cercado sem opções. Além disso, os checkpoints são generosos e reabastecem sua vida completamente.
O mesmo não pode ser dito das batalhas contra os Chefes finais (isso mesmo, no plural), onde a dificuldade dá um salto grande quando comparado ao restante do título. Muitos podem gostar desse final mais desafiante, e faz sentido já que ele é o ápice da jogabilidade, onde o jogador já teria o conhecimento e a prática suficientes para superar qualquer batalha. Mas mesmo assim, sinto que pesaram um pouco a mão e que isso poderia ter sido trabalhado de forma mais gradual a cada Chefe, ou ainda caso Clid fosse um pouco mais rápido.
Já em relação aos visuais, Clid The Snail faz um trabalho modesto nesse ponto. Não são os melhores gráficos que você vai ver ou os cenários mais detalhados, embora alguns biomas como Broken Sea Islands se destaquem dos demais, com uma direção artística interessante dentro da proposta desse mundo.
A única coisa que realmente não gostei na arte do jogo foi um efeito de claridade, ou uma espécie de fumaça, que cobre a maioria dos cenários externos, que me incomodou bastante, mesmo alterando as configurações da minha TV. Entendo que isso é uma decisão artística para criar um ambiente inóspito, mas dentro da minha preferência pessoal, gostaria muito mais de cenários com um contraste mais alto e sem esse efeito.
Contudo, para além do combate e dos gráficos, o que realmente diferencia ele de outros jogos do gênero, além de você ser um caramujo, é apostar em uma ambientação sci-fi pós-apocalíptica e no desenvolvimento da história dos personagens e da relação entre eles.
Fica claro que o mundo do game é o nosso, e que por algum motivo a raça humana não existe mais faz um bom tempo. Nessa nova sociedade, de alguma forma os animais ganharam consciência e passaram a ter comportamentos antropomorfizados e se agruparam em tribos, de forma muito semelhante a como nossa própria sociedade é organizada, inclusive nos seus defeitos.
Dessa forma a desenvolvedora Weird Beluga conseguiu tocar de maneira muito delicada em temas como preconceito racial, por exemplo. Quando nos são revelados os motivos para que seus outros companheiros tenham sido abandonados por seus clãs, ou mesmo pela forma com que os animais de uma espécie tratam os de outras, ficou evidente para mim que a mensagem era um pouco mais profunda.
Essa narrativa é um ponto central para experiência de Clid The Snail, e que talvez passe despercebida por muitos que não entenderem inglês, visto que o game não foi lançado com legendas em português do Brasil. Considero esse um problema em qualquer lançamento atual, visto que somos um mercado consideravelmente grande no cenário mundial de games, mas que ainda sofre com a barreira de nem todos terem proficiência em uma segunda língua.
Como o game faz parte da iniciativa PlayStation Talents da Espanha, que consiste em fornecer suporte financeiro a estúdios indies, pode ser que mais recursos sejam alocados após o lançamento caso ele performe bem nas vendas e talvez esse problema da falta de legendas em português do Brasil possa ser resolvido através de atualizações.
Entretanto, adorei o jogo e não tenho como não recomendá-lo para todos que gostam de twin-stick shooters, tanto pelo seu combate muito bom, mesmo que, particularmente, eu prefira ritmos mais frenéticos estilo bullet hell, como também pela sua história, que é excelente e com várias reviravoltas interessantes, mesmo que algumas sejam um pouco previsíveis em determinado momento.
A análise de Clid The Snail foi escrita com base em uma cópia de PlayStation 4 gentilmente cedida pela assessoria de imprensa do game e jogado em um PlayStation 5 através da retrocompatibilidade do console.