Análise Far Cry 6 (PlayStation 4 e PlayStation 5)
Em Far Cry 6 o jogador é um guerrilheiro revolucionário e luta para libertar Yara das garras de um Ditador interpretado pelo ator Giancarlo Esposito.
A indústria dos jogos eletrônicos viu seus esqueletos serem escancarados nos últimos anos. As notícias de novos lançamentos passaram a disputar o destaque com os problemas relativos ao excesso de horas de trabalho dos times de desenvolvedores (crunch time na Naughty Dog) e quando essas chamadas pareciam estar esfriando, surgiram as denúncias de abuso nos ambientes de trabalho (Ubisoft e Activision-Blizzard).
Além das terríveis notícias envolvendo ex-executivos, a Ubisoft também teve um ano ruim no seu relacionamento com o público fã da marca Tom Clancy ao anunciar títulos que, quando não desviavam da proposta do estilo (Tom Clancy X-Defiant) tiveram a desastrosa idéia de retratar um movimento social como grupo terrorista (Tom Clancy’s Elite Squad).
Com a reputação já marcada pela fama de lançar jogos parecidos demais entre si, a imagem da companhia francesa estava (está) no fio da navalha e ela precisava (ainda precisa!) mostrar aos fãs que é capaz de publicar jogos legais e se afastar de litígios.
Entra em cena Far Cry 6. O novo título da série de shooters em primeira pessoa iniciada em 2004 acabou de ser lançado trazendo consigo um vilão interpretado pelo carismático Giancarlo Esposito (Gus Fringe de Braking Bad) e tem a responsabilidade de tentar virar a maré a favor da Ubi, pelo menos no que diz respeito aos jogos lançados.
Liberdade! Liberdade! Abra as Asas sobre Nós
Uma história clássica. Yara, um arquipélago latino-americano fictício, viu seu presidente eleito dar um golpe de estado e se tornar ditador. Antón Castillo agora controla com mão de ferro as ilhas e seu principal produto, o tabaco – matéria prima do Viviro, substância tida como potencial cura para o câncer. Os planos de Antón incluem instituir uma dinastia que continuará no poder quando seu filho, Diego Castillo, se tornar adulto.
Nossa história se inicia quando Dani Rojas, ex militar, tem seu barco atacado pelas Forças Nacionais, digo, Fuerzas Nacionales de Defensa ao tentar fugir da ilha e da nova política de recrutamento obrigatório de trabalhadores para os campos de tabaco. Prática também conhecida como escravização. Após muito relutar, Dani não vê outra alternativa senão se juntar ao grupo rebelde, Libertad, agora que seus amigos foram mortos durante os protestos na noite em que Yara se fechou em um Estado de Sítio.
Soou familiar? Pois é. Far Cry 6 usa vários clichês narrativos para envolver o jogador na missão de reunir lideranças ao redor do arquipélago para dar cabo da ditadura que tornou a cair sobre Yara e não raro você vai se sentir como se fizesse parte da Aliança Rebelde (Star Wars). Mesmo com uma motivação justa, alguns personagens possuem um pouco de moral e atitudes questionáveis, o que ajuda a mantê-los interessantes, como é o caso de uma das nossas primeiras aliadas, Camila “La Espada” Montero, e embora também existam vários NPCs genéricos, Far Cry 6 traz um bom número de personagens relativamente bem escritos e carismáticos.
Aliás, carisma é uma das grandes características que fazem esse jogo ser melhor que o seu antecessor em quase tudo (ou tudo) a começar pela personagem principal que dessa vez possui um nome e personalidade – e é muito bem humorada pra quem está numa guerrilha a ponto de cantar as músicas que tocam no rádio. Dani, que pode ser um rapaz ou uma moça, é um dos tripés que mantém Far Cry 6 interessante juntamente com o vilão e a própria Yara, território super divertido de explorar.
De volta à América Latina
Apesar de fictícia, o país é claramente inspirado em Cuba – Yara é uma cidade cubana – e sua economia gira em torno da agricultura (cultivo e exportação de tabaco). Mas diferentemente do que vimos em Ghost Recon Wildlands, jogo em que a Bolívia é tomada por um cartel exportador de cocaína, em Far Cry 6 a droga produzida pelo governo, supostamente é capaz de curar o câncer, “O presente de Yara para o mundo”, segundo a propaganda estatal.
Geograficamente, Yara é bem menos dinâmica que a Bolívia, já que toda ela é um território tropical com biomas relativamente semelhantes, mas apesar de homogêneo, o país é lindíssimo. A ausência de áreas nevadas é compensada pelas praias, montanhas e cachoeiras e pelo pôr-do-sol quase fantástico.
Esses elementos deixam o cenário muito mais próximos de nós aqui no Brasil do que os 4 jogos anteriores – Blood Dragon, Far Cry 4, Far Cry 5 e New Dawn – e também do que foi mostrado em Far Cry 3. Como Yara está aqui na América, a arquitetura, a população e seu idioma deixam tudo muito mais familiar e atrativo, pelo menos para mim.
Inclusive, faça um favor a você mesmo e coloque todo o áudio do jogo em espanhol. As vozes são outras mas ajuda muito na imersão e é sempre legal ouvir Dani xingando os inimigos no idioma nativo dela.
Outra adição positiva é que agora podemos montar cavalos. Os controles poderiam ser menos binários – o cavalo anda lento ou corre desembestado, sem nenhum trote intermediário – mas agora Far Cry 6 faz parte do seleto panteão de jogos com cavalos, um animal sempre muito bem vindo em qualquer jogo. Além dos nossos amigos equinos, outros animais fazem companhia para as missões, entre eles, Guapo, o Cocodrillo de estimação de Juan Cortéz e o fofíssimo Chorizo, o cãozinho salsicha com rodinhas que pertence ao mecânico Philly e que pode ser acionado como um “Parça”.
De resto, a fauna da Yara contribui para o caos do mesmo jeito que já ocorria nos títulos anteriores: cavalos disparam no meio do tiroteio, pegam fogo e incendeiam pastos, javalis atacam qualquer pessoa que chegue perto deles, coiotes passeiam pelas matas à espreita e touros soltos arrebentam tudo o que estiver na frente. As destruições procedurais geradas pelos sistemas autônomos do jogo são marca da série e obviamente contribuem para diversão – a missão inicial de destruição de campos de tabaco é incrível – mas o constante aparecimento de carros e caminhões da FND nas estradas durante a tomada dos pontos de controle, em vez de parecer uma ofensiva coordenada, parece mais uma sucessão aleatória de veículos.
Um problema que percebi na performance do jogo é que as cutscenes sofrem quedas estranhíssimas nas taxas de quadros (Ps5) e a tela sofreu alguns cortes (screen tearing) quando eu estava pilotando helicóptero. Esse detalhe não parece nada drástico, enquanto o primeiro pode incomodar jogadores mais exigentes.
¡Amigo Estoy Aqui!
Far Cry 6 não reinventa a roda. Se você jogou todos os títulos anteriores e acha que já viu tudo que a Ubisoft poderia entregar na franquia dela, esse texto dificilmente te convencerá do contrário. Ainda assim, o sexto jogo numerado da série tem ótimas melhorias em relação ao jogo anterior, com a sua identidade sendo demonstrada pelos detalhes do mundo e dos personagens como as armas e equipamentos improvisados, chamados apropriadamente de gambiarras, e o cenário belíssimo de Yara. A história simples ajuda na motivação para ir até o fim do jogo e as diferentes regiões e seus personagens variados e com interesses distintos – conflitantes por vezes – contribuem muito para renovar nosso interesse na missão principal: libertar os Yaranos da ditadura de Castillo.
A versão de PlayStation 4 inclui upgrade gratuito para a geração atual, o que é um ótimo incentivo e como todo Far Cry recente (você não, Primal) você pode derrubar Antón Castillo junto com um amigo.
A análise de Far Cry 6 foi escrita graças a uma cópia digital gentilmente cedida pela assessoria de imprensa do jogo.