Análise Evil Dead: The Game (PS5)
Um presente para os fãs dos filmes e da série de TV, Evil Dead: The Game traz novos temperos ao gênero de multiplayers assimétricos.
O mal está entre nós. Finalmente Evil Dead: The Game foi lançado, e só o fato de poder escrever essa frase já me deixa extremamente feliz.
E essa felicidade toda se deve inicialmente a um motivo: sou um grande fã dos filmes da franquia Evil Dead e da série Ash vs. Evil Dead. Nem sei quantas vezes já assisti a trilogia original, em especial Army of Darkness. Mas sei que foram mais vezes do que gostaria de admitir, e menos vezes do que, com certeza, ainda assistirei.
Assistir a franquia de comédia-horror que mostrou ao mundo o que Sam Raimi é capaz de fazer com seus amigos, pouco orçamento, tripas cenográficas, e litros e mais litros de sangue falso se tornou uma tradição que espero conservar por muitos anos e repassar aos meus filhos quando eles tiverem idade suficiente para apreciar um excelente filme B, sem ficarem, claro, completamente traumatizados.
O segundo motivo para esse sentimento de alegria é que Evil Dead: The Game é incrivelmente divertido, mesmo para quem nunca teve contato com Ash e sua turma.
Claro, conhecendo os filmes você aproveitará ao máximo todas as referências presentes no jogo — e elas são muitas. Desde cenários clássicos como a cabana dos dois primeiros filmes; armas como a motosserra e o Pau de Fogo; o carro Oldsmobile Delta 88 Royale; personagens de todas as entradas da franquia, incluindo aqui os vilões, e falas icônicas (e ridículas) como “Gimme some sugar, baby”, magistralmente dubladas por Bruce Campbell, o próprio Ashley Joanna Williams (É, o pai dele era um sacana e pelo visto fã de Johnny Cash), com seu humor canastrão de perdedor transformado em herói, transformado em única salvação da humanidade contra as forças do mal.
Aliás, ponto positivo para os desenvolvedores da Saber Interactive que conseguiram reunir a maior parte dos atores originais para dublar suas contrapartes no jogo, algo, infelizmente, não tão comum nos dias de hoje para a maioria das adaptações. Além disso, o game está totalmente localizado e legendado em português do Brasil, outro fator positivo e importante para que mais pessoas possam apreciar o festival de matança — justificada — presente no jogo.
Mas deixando um pouco de lado a perspectiva de fã do material de origem, e voltando ao meu papel que é analisar, da forma menos parcial possível, os games que recebemos aqui no Conversa para review: “Do que se trata Evil Dead: The Game?”
Evil Dead: The Game é um jogo do tipo multiplayer assimétrico, e caso você não tenha familiaridade com o termo eu explico o que ele significa. Diferente de um multijogador competitivo, em um assimétrico os jogadores são divididos em equipes com objetivos distintos, que, normalmente, envolvem atrapalhar ou impedir que o outro time conquiste a vitória.
Tomando a franquia Call of Duty como exemplo, nele diferentes equipes competem, mas com um mesmo objetivo. Seja capturar as bases adversárias ou atingir um número maior de mortes em um menor intervalo de tempo, o gameplay é sempre o mesmo para todos os participantes. Já em um jogo assimétrico as coisas funcionam de formas únicas para cada grupo de jogadores.
Por exemplo, em Dead by Daylight — um dos títulos de maior sucesso dentro do gênero de multiplayers assimétricos — um time precisa sobreviver e fugir, enquanto outro jogador assume o papel de um serial killer, cujo propósito é infernizar e acabar com a vida desses pobres coitados. Nesse caso, não só os objetivos são diferentes, como a forma de alcançá-los também.
Para ficar ainda mais fácil de digerir essa definição, pense em um jogo do estilo como uma brincadeira que todos participamos durante nossas infâncias: esconde-esconde.
Mas diferente do esconde-esconde de Dead by Daylight ou Friday the 13th: The Game, em que os jogadores são presas vulneráveis para o matador, e a alternativa mais viável é fugir, em Evil Dead: The Game os sobreviventes são os heróis da situação, com todos os recursos para lutar de igual para igual contra os demônios kandarianos. O objetivo não é fugir do mal, mas sim aniquilá-lo. Ou se preferir, você também pode se juntar ao exército de mortos-vivos e ser o jogador que controla as forças do submundo. Tem carnificina para todos os gostos.
Como sobrevivente é possível escolher jogar com quase todos personagens do universo Evil Dead, desde todas as incarnações de Ash, nas suas diferentes personificações dos filmes e série de TV, até os personagens “secundários” como Cheryl Williams, Scotty, Annie Knowbury, Ed Getley, Henry the Red, Lord Arthur, Kelly Maxwell, Pablo Simon Bolivar, Amanda Fisher. E do lado dos demônios a variedade também é boa: Henrietta, Esqueletos, Esqueletos de Elite, Deadites, Deadites de Elite, Deadite Berserker, Lordes de Guerra Deadites, Demi Eligos, Eligos e Evil Ash.
Cada um desses personagens pertence a uma classe, e além dos atributos individuais de cada um, separados em um árvore de habilidades gigantesca, o agrupamento em classes é um bom indicativo para quem está começando o game, e para que os times montem suas estratégias. As classes Líder, Guerreiro, Caçador e Suporte pertencem aos sobreviventes, e as classes Lorde de Guerra, Marionete e Necromantes são as dos demônios. Cada uma tem as suas próprias habilidades passivas e ativas, que somadas às individuais, serão a chave para a vitória, independente do lado escolhido.
Não vou entrar em detalhes sobre cada uma ou este review ficaria imenso, e esse não é o objetivo, mas vou citar dois exemplos de cada.
Quando a habilidade dos personagens listados na Classe Líder é ativada todos os jogadores dentro da sua área de efeito recebem menos e causam mais danos aos inimigos, além disso a sua barra base de resistência ao medo é a maior dentre todos os jogadores. E o gerenciamento dessa barra de medo é parte fundamental do jogo, porque com medo alto os sobreviventes podem ser possuídos e lutar momentaneamente do lado do mal. Já os Caçadores são especialistas em combate a longa distância, causam mais dano com armas de fogo e bestas, podem carregar mais munição, além de recarregarem suas armas mais rapidamente.
Do lado do mal, os Necromantes podem criar exércitos de esqueletos e usar habilidades para ressuscitar aqueles que os sobreviventes conseguirem matar, enquanto a Classe Marionete é especialista em possessão, tanto de aliados como dos próprios sobreviventes que estejam com o nível de medo alto, além do uso de poderes telecinéticos para imobilizar suas presas.
Apesar dos dois estilos de jogabilidade (Bem versus Mal) serem extremamente diferentes, o balanceamento entre elas é muito bem feito, exceto por uma pequena grande diferença.
O time dos sobreviventes precisa jogar coordenadamente em equipe, enquanto as decisões tomadas pelo jogador na pele do Demônio não depende desse fator. Um jogador que sabe o que está fazendo como o mal encarnado consegue dizimar uma equipe inteira de sobreviventes com relativa facilidade, mas um sobrevivente que queira enfrentar as hordas demoníacas sozinho não irá longe, e ainda colocará toda sua equipe em risco.
Jogando como sobrevivente os jogadores passarão por três etapas de jogabilidade bem definidas. A primeira delas envolve a coleta de recursos como armas, cura, escudos, munições, bem ao estilo battle royale, enquanto procuram 3 partes de um mapa que revelará a posição do Necronomicon, o livro do mortos, e da Adaga Kandariana. Com a localização dessas duas relíquias — que são reveladas ao demônio desde o início da partida — é necessário ir até seus locais e defender a posição por um período de tempo. Após essa fase, a localização dos Sombrios (os seres responsáveis por todo o mal no universo Evil Dead) é adicionada ao mapa, e então o objetivo passa ser banir essas entidades e defender o Necronomicon por dois minutos.
Nesse ponto, a jogabilidade é mais próxima ao estilo de gameplay de Left 4 Dead, e bem diferente da implementada em Dead by Daylight, por exemplo. E isso é um elogio.
Enquanto os sobreviventes estão realizando essas ações, o jogador controlando o demônio também estará se preparando, juntando recursos na forma de orbes de energia maligna, que são usados para criar armadilhas, dando sustos nos jogadores para aumentar seu medo e controlando inimigos para ataques diretos, já que, assim como nos filmes, o mal é uma entidade incorpórea que vaga pela floresta e pode possuir qualquer um.
É um pouco difícil jogar a primeira vez como demônio por conta desse “voo” em primeira pessoa que a entidade faz, e pela velocidade de movimentação que ela tem, mas depois que se pega o controle desses movimentos, é incrivelmente delicioso.
De uma certa maneira, jogar como Demônio possibilita que o jogador seja uma espécie de dungeon master do mal em Evil Dead: The Game, já que ele é o responsável por preparar o cenário da aventura, colocando armadilhas e gerenciando a energia necessária para invocar os monstros certos nas horas certas, já que essas habilidades funcionam com um tempo de recarga.
Como mencionado anteriormente, existe uma árvore da habilidades completíssima com diversas vantagens para cada personagem, e os pontos obtidos nas partidas podem ser usadas para melhorar o boneco preferido. Um ponto positivo é que mesmo que se jogue com um determinado personagem a experiência acumulada pode ser usada para evoluir qualquer outro.
Além dessa árvore de melhorias permanentes, existe uma disponível durante a partida que concede vantagens temporárias dentro daquele jogo. É preciso encontrar baús de tesouro que contenham pontos que possam ser usados para aumentar vida, resistência ao medo, escudo, dano causado, diminuição dos custos de possessão, entre outros. Essas vantagens duram até que a partida acabe, e na próxima é preciso encontrá-los novamente.
Caso você não goste de jogos multiplayer, a boa notícia é que o game conta com modos em que é possível jogar com amigos contra um demônio controlado por inteligência artificial, ou sozinho com companheiros e demônio controlados por essa IA. Em contraparte não existe um em que seja possível encarnar o demônio contra bots, o que é uma pena.
Além disso, Evil Dead: The Game conta com missões single player, e embora elas não possam ser consideradas como uma campanha propriamente dita, elas contam histórias complementares aos filmes e série, pegando trechos não vistos em nenhum deles.
É uma parte curta do game, mas que tem um apelo significativo para fãs como eu, e também um propósito que precisa ser considerado por todos: alguns dos personagens só são liberados para serem usados na porção multiplayer quando você completar essas missões. Esses 5 capítulos solo valem muito a pena, apesar do nível de dificuldade da maioria deles ser um pouco exagerada às vezes.
Mas, sem mais delongas, o que vocês devem estar se perguntando é:
“Evil Dead: The Game vale a pena?”
Claramente esse é um daqueles jogos que foi feito por fãs para os fãs.
Ele é muito respeitoso e referencial em relação ao material original, e mesmo que o charme principal seja ser um produto Evil Dead, quem não tiver nenhum apego, ou mesmo conhecer a franquia, ainda vai ter em mãos um game bonito, bem balanceado, relativamente sem bugs e divertidíssimo, acima de qualquer coisa.
E quem estava com receio de que ele seria uma espécie de Dead by Daylight genérico pode ficar tranquilo, apesar de pertencer ao mesmo gênero, ele é um título muito mais completo e complexo comparado a DbD no seu lançamento. Jogar como sobrevivente depende muito de coordenação de equipe, e só o fato de você não ser um fugitivo vulnerável já afastam as comparações de imediato. Além disso, a jogabilidade da porção demônio é diferente de tudo feito em jogos similares, e uma ótima variação do estilo.
Contudo, assim como vários jogos exclusivamente on-line ele padece do mesmo problema, ou de um possível futuro problema: a vida útil de Evil Dead: The Game depende da base de jogadores que ele conquistar e conseguir manter, ou de quanto tempo os servidores estarão ativos após o lançamento.
Atualmente, e também graças a jogabilidade entre plataformas, não é difícil encontrar partidas, mas sem internet, ou se os servidores caírem, como aconteceu no lançamento, não é possível nem acessar as missões solo do jogo. Isso, pelo menos para mim, é um ponto extremamente negativo, e que não deveria existir.
Jogar com amigos e jogar com desconhecidos também influenciará bastante na percepção da experiência final. O que também pode ser um problema.
Um time desordenado vai tornar a vida de quem jogar como sobrevivente em Evil Dead: The Game um pesadelo, mas, felizmente, por contar com modos contra a inteligência artificial, isso pode ser parcialmente mitigado, apesar deles não ser tão divertidos como o multiplayer de verdade. Outra opção para quem prefere ser um lobo solitário é jogar como Demônio, já que assim a estratégia só dependerá de você e mais ninguém.
Outra coisa que só depende de você é escolher se dará ou não uma chance ao game.
Apresentei aqui os pontos positivos, os negativos, minha visão de fã e meu olhar crítico, mas quem decide no final se essa é uma experiência que você deseja ter é você mesmo. A única coisa que te peço é que se um dia você encontrar um livro abandonado em uma cabana, não leia. Essa sim pode ser uma experiência que você não gostaria de ter.
A análise de Evil Dead: The Game foi escrita com base em uma cópia de review gentilmente cedida pela assessoria de imprensa do game. Também disponível para PlayStation 4, Xbox One, Xbox Series e Microsoft Windows, através da Epic Games Store.