Análise Dolmen (PS5)

Dolmen, souls-like de ficção científica desenvolvido no Brasil, tem ideias e conceitos ótimos, mas a execução deixa muito a desejar.

Review Dolmen

Segundo pesquisa conduzida pela consultora Newzoo, em 2021 o Brasil ocupou a 10° posição entre os países que mais geraram receitas para o indústria de games no mundo, com valores estimados na casa dos 2,53 bilhões de dólares, e um mercado consumidor com aproximadamente 92,4 milhões de jogadores, o que nos torna o 3° maior em escala global, atrás apenas de China e Estados Unidos.

O crescimento do nosso interesse por jogos propiciou que nos últimos anos ocorresse o surgimento de diversos estúdios de desenvolvimento nacionais. Aquiris, Belhold Studios, PixelHive, Pulsatrix Studios, Long Hat House, Mad Mimic, PixelPunk, JoyMasher, Glitch Factory, Hazel Sky e a unicórnio, especialista em mobile Wildlife Studios, são apenas alguns exemplos de estúdios nacionais com sucessos recentes de crítica, como Unsighted, Horizon Chase Turbo, Chroma Squad, Blazing Chrome, No Place for Bravery e Dandara, entre outros.

Para fazer companhia a esses nomes, e dezenas de outros, a desenvolvedora Massive Work Studio, baseada em Natal, Rio Grande do Norte, lança amanhã (20/05) Dolmen, seu primeiro game para PC e consoles, e um dos projetos mais ambiciosos do mercado nacional. Se não for o mais ambicioso.

Dolmen

Dolmen é um RPG de ação souls-like com temática que mistura ficção científica e horror cósmico, bem desafiador — e até injusto em vários momentos, em que o jogador assume o papel de um empregado da Megacorporação Zoan enviado para investigar um evento catastrófico em Revion Prime, planeta rico em cristais dolmen, material usado para viagens interdimensionais. Contudo, os interesses reais da companhia, e a sua missão, talvez não sejam o que parecem.

A história é contada majoritariamente através de arquivos de log encontrados pelos cenários, diálogos entre seu personagem e seu contato em Zoan e algumas poucas cutscenes. Os diálogos são muito bem dublados tanto em inglês quanto em português, e o título conta ainda com legendas em 13 idiomas, um número muito expressivo para um jogo independente.

Esse fator sozinho é um indicativo do tamanho da ambição, vontade e paixão por um projeto colocadas em Dolmen, mas, infelizmente, essas características não são suficientes para que ele seja uma recomendação fácil como eu achei que seria.

Vermes malditos em Dolmen

Anunciado há 5 anos, Dolmen passou, desde que foi apresentado, por diversas reformulações visuais e melhorias na cadência de combate, mas ele ainda conserva elementos de design ultrapassados que remetem a jogos mais antigos, especialmente em seus menus pouco intuitivos e confusos.

Navegar pelas abas de construção de armas e armaduras é sofrível, e parecem ter sido pensadas apenas para jogadores de PC com o uso de mouse e teclado.

O combate, que é a joia da coroa em qualquer souls-like, é apenas ok, e não é um dos melhores disponíveis, apesar de algumas ideias muito interessantes.

Rainha Caniptei em Dolmen

A responsividade, peso dos golpes e reação dos inimigos a eles varia de inexistente a médio, em alguns casos. Isso transforma as lutas, mesmo contra inimigos comuns, em um teste de paciência, já que não é raro que eles ataquem sem piedade mesmo depois de sofrerem danos consideráveis.

Um bom jogo do estilo recompensa o jogador por sua habilidade, paciência e capacidade em superar os desafios impostos através da repetição. Morrer várias vezes, aprender com seus erros e chutar a bunda do inimigo que levou a melhor contra você em um primeiro momento é uma das melhores sensações em um game, e explica em partes a grande adoração que as pessoas tem pela From Software, e por várias empresas inspiradas por ela.

Mas, para que isso aconteça é necessário que tal jogo tenha um balanceamento refinado, que torne as lutas desafiadoras sem serem injustas. O combate precisa criar aberturas claras na movimentação dos inimigos que permitam dar espaço para que o jogador reavalie sua estratégia no calor da batalha.

Mecânica de tiro

E não é que Dolmen não faça isso, porque ele faz, mas nele essas aberturas são menos frequentes do que deveriam, acabam rápido e, como mencionado, deixam o jogo muitas vezes menos justo do que deveria.

Apesar disso, existem sistemas que são efetivos quando você descobre como usá-los ao seu favor, o problema é que o game é confuso e entender como eles  funcionam exige um pouco mais de esforço. Mas não tema! Estou aqui para facilitar as coisas para quem quiser dar uma chance ao jogo.

A parte mais interessante de Dolmen, e o grande diferencial do título dentro do gênero, são os sistemas que ele usa para lidar com o gerenciamento de energia e as tecnologias humanas e alienígenas.

Escudos de energia em Dolmen

Assim como em muitos souls-like, aqui existem uma barra de vida; uma de estamina, utilizada para atacar, correr e desviar; e uma de magia/energia usada para ataques especiais, mágicos, etc. A diferença nesse caso, é que essa barra de energia em Dolmen é utilizada para três funções distintas: um modo de energia, munição para sua arma de fogo e como cura.

Essas são mecânicas muito interessantes porque ao usar o mesmo recurso, o gerenciamento dessa energia é vital para o combate.

O modo de energia (que não consome permanentemente essa barra), garante ao jogador uma adição elemental aos ataques (fogo, gelo ou ácido) e impede o gasto de estamina durante seu efeito. Isso significa que você pode aplicar alguns golpes e explorar fraquezas a elementos de cada inimigo, e ainda preservar sua estamina para ações de evasão ou de defesa.

Zimodonte

Enquanto isso, a utilização dessa energia como munição depende da arma utilizada e do modo de tiro. O tiro leve gasta energia, mas ela regenera com o tempo, já o tiro pesado, na maioria das vezes, gasta permanentemente esse recurso, que pode ser recobrado utilizando um consumível chamado bateria.

Vale dizer que o uso de armas é uma mecânica central do game, tão importante como o combate corpo a corpo.

Já a última função dessa energia é o uso dela como cura. Isso cria uma dinâmica única realmente muito interessante, porque é preciso balancear a melhor hora para atacar e quando usar essa energia em seus diferentes modos para atacar.

O segundo destaque de Dolmen, e o sistema que mais gostei, é a forma como as 3 tecnologias presentes no jogo são utilizadas, sendo elas: Humana, Revian e Driller.

Menu de Tecnologias

Cada parte das armaduras e as armas, sejam elas de longo ou de curto alcance, possuem um tipo específico de tecnologia atrelada a elas. E, basicamente, essas tecnologias funcionam como complemento às classes e atributos do game, concedendo vantagens específicas de acordo com as peças equipadas.

Por exemplo, o atributo Ciência governa o dano que as armas de fogo causam, então melhorar esse status será essencial para quem desejar fazer uma build focada em combates a longas distâncias. E, visto que o tiro consome energia, usar tecnologias que melhorem o uso desse recurso é a estratégia mais viável. Nesse exemplo específico, investir em partes de equipamento Humano garantirão melhorias dentro dessa tecnologia.

Os primeiros níveis da tecnologia Humana permitem recuperar uma pequena quantidade de energia com ataques corpo a corpo, e os níveis mais avançados aumentam a quantidade desse recurso recuperado pelas baterias e também melhoram o dano à distância.

Armaduras

Essa é uma mecânica tão interessante que muitas vezes optei usar uma armadura com menos resistência a ataques físicos, mas que me permitisse também ter pontos nas duas outras tecnologias para aproveitar suas vantagens. No caso, a tecnologia Revian melhora a quantidade de vida, estamina e dano ácido; enquanto a Driller foca em atributos que melhoram defesas, resistências e vida.

Infelizmente, essa porção RPG tão singular de Dolmen fica soterrada dentro de menus ultrapassados de criação de equipamentos, e entender como fazer essas combinações é pouco intuitivo e talvez alguns jogadores nem percebam o quão única ela é.

Mas o que mais pesa contra o jogo, na minha opinião, é o seu combate sem peso, principalmente contra os Chefes. É difícil obter uma resposta, além da visual, de que seu personagem foi acertado ou que seus golpes conectaram justamente por esse aspecto de “leveza” no combate. E, considerando que esses indicativos táteis são de extrema importância para um souls-like, a forma como o combate foi implementado aqui deixa a desejar.

Doutora Lobodja em Dolmen

Eu não consigo não gostar de Dolmen e achar ele um bom jogo, porque ele tem ideias excelentes que achei muito interessantes como as mencionadas acima, a possibilidade de reviver Chefes ou enfrentá-los em co-op (que acabei nem citando) e o funcionamento de determinadas armas. Mas também não posso recomendar ele para nossos leitores por todas as ressalvas apresentadas, e por conta o preço cobrado por ele no PlayStation (R$ 199,50) no lançamento.

Por outro lado, considerando todas as limitações que um estúdio nacional enfrenta, mesmo que a desenvolvedora tenha recebido suporte e aporte financeiro da publicadora Prime Matter, uma empresa do grupo Koch Media, criar um game desse gênero e com essa qualidade visual — mesmo que os gráficos não sejam os mais modernos — é um feito histórico enorme para um indústria que amadurece a passos largos a cada dia, já que, com os jogos citados no início desse review — e agora com Dolmen, mostramos que talento não falta para os desenvolvedores brasileiros.

Dolmen

A análise de Dolmen foi escrita com base em uma cópia de review gentilmente cedida pela assessoria de imprensa do game. Também disponível para PlayStation 4, Xbox One, Xbox Series e Microsoft Windows.

Papai Platina
(Pouco) conhecido como Willian. Marido, pai de três filhos maravilhosos, fã de Stephen King, filmes toscos e trophy hunter nas horas vagas. No Twitter como @papaiplatina e willianmarques na PSN.