Análise A Plague Tale: Requiem (PS5)

A Plague Tale: Requiem amplifica o que o primeiro game tinha de melhor e, com jogabilidade mais refinada, se torna um dos melhores do ano.

Review A Plague Tale: Requiem

A Plague Tale: Requiem é um carrossel de emoções.

E por mais que isso talvez soe sentimental — ou exagerado — em um primeiro momento, é a mais pura verdade. Ou pelo menos foi assim para mim, e imagino que para a equipe de desenvolvedores da Asobo Studio também tenha sido.

Requiem materializa a evolução de um trabalho iniciado em 2019 com o lançamento de A Plague Tale: Innocence, um jogo excepcional, que por não ser de um estúdio reconhecido pelo público em geral precisou conquistar seu espaço gradualmente e dependeu muito do boca a boca dos jogadores para isso.

Afinal, era uma tarefa quase impossível ser destaque em um ano onde crítica e público estavam com seus radares apontados para Resident Evil 2, Death Stranding, Gears 5, Luigi’s Mansion 3 e Sekiro: Shadows Die Twice, só para citar alguns dos blockbusters lançados em 2019.

Atiradeira em ação

E por mais que Innocence não tenha o mesmo valor de produção dos mencionados, ele fez um trabalho igualmente fenomenal, conseguiu alcançar um nível de qualidade comparável e se tornou uma recomendação fácil de ser feita.

Todos para quem indiquei ele ficavam impressionadas e questionando como tinham deixado um jogo tão bom passar despercebido assim. Essas pessoas o recomendariam para outro grupo de amigos, que por sua vez o apresentavam para outros amigos, que então… Bem, você entendeu.

E com muitos fazendo esse mesmo trabalho de formiguinha, em julho de 2020, o título conseguiu chegar a 1 milhão de cópias vendidas, uma marca histórica para um jogo original do estúdio.

Isso sem contar que o número de jogadores que teve acesso a ele pouco depois é exponencialmente muito maior, já que Innocence ficou disponível sem custos adicionais no catálogo do serviço de assinaturas da Microsoft, o Xbox Game Pass, por mais de dois anos e meio, saindo apenas recentemente.

E, me valendo de uma frase/meme muito usada na internet — e que descreve bem a situação do novo trabalho da desenvolvedora — Innocence andou para que A Plague Tale: Requiem pudesse correr. E ele entrou nessa corrida para ganhar.

A Plague Tale: Requiem

Requiem evolui a fórmula de Innocence de uma forma consciente e natural. Enquanto algumas desenvolvedoras acreditam que mais conteúdo se resume a criar mapas maiores e lotá-los com atividades desinteressantes e repetitivas, a Asobo entendeu como expandir o que o primeiro jogo fazia muito bem, refinar seus pontos fracos e balancear o crescimento de sua IP de forma controlada, sem cair nessa armadilha.

Confesso que ao anunciarem que o game teria o dobro de duração da campanha, comparado ao primeiro, fiquei receoso de que em 20 horas talvez ele se perderia em algum momento.

Entretanto, após terminá-lo a primeira vez e, imediatamente, começar (e terminar) seu Novo Jogo + para fins deste review, ainda consigo sentir a emoção de determinados momentos só de relembrá-los. E a gama de sentimentos variou muito nessas quase 40 horas com os irmãos Amicia e Hugo de Rune.

A Plague Tale: Requiem

Passei, na mesma intensidade, por alegria, tristeza, contemplação, medo, nojo, incredulidade, pesar e raiva. Algumas vezes em um mesmo capítulo, e em outras situações sem tempo para separar todos esses sentimentos conflitantes.

Como mencionei na primeira linha desse texto, um carrossel de emoções que só as melhores obras (de qualquer mídia) conseguem fazer.

Já me emocionei muitas vezes com filmes, música e livros, mas com videogames ainda consigo contar nos dedos às vezes em que o coração ficou pesado como aqui. E, embora isso tenha relação com diversos fatores — inclusive externos ao game como a paternidade, por exemplo — isso diz muito sobre o que uma obra de ficção é capaz de alcançar.

E para que você consiga aproveitar o jogo da mesma forma que eu pude apreciá-lo, fique tranquilo, esse review é totalmente livre de spoilers.

Amicia e Lucas

A história começa seis meses após o final do primeiro jogo, em 1349, com os irmãos, agora na companhia de sua mãe Beatrice e do aprendiz de alquimista Lucas, viajando para a região de Provença, no sul da França em busca de uma cura para a Mácula, a doença misteriosa que toma conta de Hugo.

Apesar da narrativa ainda se situar durante o período da Guerra dos Cem Anos e da Peste Negra, o game foca muito pouco no aspecto histórico desses eventos (diferente do primeiro), apesar das suas consequências serem vívidas para alguns dos personagens secundários, como Arnaud e Sophia — Novos companheiros de aventura e peças fundamentais tanto para a narrativa como para a jogabilidade.

Sophia e Hugo ajudando nos puzzles

Esse abandono do verniz histórico para a construção da narrativa era esperado já que o final de Innocence abraça a parte mística da Mácula, sua relação com a Praga de Justiniano (outro evento histórico) e os efeitos dela em Hugo e sua relação com os ratos.

Isso me desapontou um pouco em um primeiro momento porque eu gostava bastante da âncora histórica do jogo de 2019, mas como mencionado, depois do final do anterior não poderia ser diferente. Além disso, os novos rumos da narrativa são tão fascinantes que esqueci essa pequena frustração e fui arrastado para a realidade nada bonita que os irmãos tem que enfrentar em um estalar de dedos.

Amicia, Hugo e Arnaud

E por falar em realidade e realismo o trabalho realizado pelos dubladores em inglês de todos os personagens, especialmente Amicia (Charlotte McBurney) e Hugo (Logan Hannan), é de uma competência extraordinária.

A emoção transmitida é tão genuína que me impressionou muito, e demonstra o quanto os atores se entregaram a esses personagens.

Outro aspecto brilhante em relação a A Plague Tale: Requiem é como ele conserva as inspirações usadas para criar o primeiro jogo, como The Last of Us e Brothers: A Tale of Two Sons, mas também acena — não sei se de forma intencional ou consciente — a games como Spec Ops: The Line, quando ele força o jogador a lidar diretamente com as consequências dos seus atos. E ele faz isso em vários momentos.

A Plague Tale: Requiem

O mundo de Requiem é cruel e às vezes para sobreviver é preciso se entregar também à crueldade.

E, embora você já tivesse que encarar essas questões no primeiro game, aqui as consequências são elevadas a enésima potência porque a escala das suas ações também é.

Complementando esse aspecto a trilha sonora, composta por Olivier Deriviere, soa perfeita para cada situação, criando organicamente momentos tensos ou de absoluta calmaria nas horas mais cruciais. Ela é quase um recurso narrativo a parte e é difícil imaginar o jogo sem ela, ou feita por outra pessoa.

A Plague Tale: Requiem

Estruturalmente A Plague Tale: Requiem é muito maior que Innocence, entretanto, isso não significa que ele é artificialmente inflado. Tudo tem o seu propósito de ser, e o arranjo dos atos é muito bem balanceado e dividido entre momentos de ação, de exploração e os puramente narrativos para exposição da história.

Com cenários mais amplos o game possibilita que o jogador explore as áreas com mais liberdade. Não chegam a ser cenários 100% abertos porque a história ainda é linear, mas existem porções enormes que podem ser visitadas em determinados capítulos e que dão a impressão de um mundo semiaberto.

O jogador visitará diversos locais ao longo dos 17 capítulos do jogo como cidades lotadas de NPCs, castelos, costas masmorras, cavernas e alguns outros, mas que não comentarei para não arruinar eventuais surpresas.

Amicia e Hugo se escondendo

E se no primeiro game a engine proprietária criada pelo estúdio conseguia renderizar até 5000 ratos por tela, agora esse número pode chegar a 300 mil. Sessenta vezes mais.

E não é só isso, além de verdadeiros tsunamis de ratos do mal, a inteligência artificial foi aprimorada e agora eles conseguem ter uma melhor noção dos seus arredores, desviar da luz com mais eficácia, se movimentar de forma mais natural, escalar determinadas superfícies e, como consequência, serem mais agressivos.

Aliás, toda a IA dos inimigos parece ter sido retrabalhada para torná-los mais eficientes e fazer frente às cartas que Amicia tem em sua manga, desde o retorno da conhecida atiradeira do primeiro jogo, até novos equipamentos como uma balestra e receitas alquímicas mais poderosas e diversificadas, utilizadas como munição e distração.

Diversos NPCs cruzam seu caminho

O jogador pode escolher entre três abordagens principais para Amicia: ser mais furtivo, combativo ou se valer mais da alquimia para lidar com as situações. Ao adotar qualquer uma dessas vertentes, mesmo que não se trate de um RPG, o atributo escolhido vai gradualmente melhorando e novas habilidades relacionadas a ele são liberadas. Também é possível combinar vários estilos de jogabilidade e tentar ser um coringa para todas situações, se preferir.

Independente do caminho escolhido, seus companheiros reagirão às posturas que adotadas, tecendo comentários sobre o quão agressiva você está se tornando ou o quanto vocês conseguiram evitar que ninguém se machucasse.

Essa parte não tem consequências para o andamento da história, mas tornam a narrativa mais imersiva e dinâmica.

Tsunami de ratos em A Plague Tale: Requiem

Vale a pena?

O trabalho feito em A Plague Tale: Requiem pela Asobo Studio — que comemora 20 anos de estúdio na data de publicação deste review — em parceria com a Focus Entertainment, superou e muito a qualidade do primeiro jogo e também às minhas expectativas.

Tive problemas mínimos com quedas de frames em alguns momentos, mas eles foram tão minúsculos frente ao que o jogo me entregou que não fizeram a menor diferença na minha experiência, no geral. Além disso, uma atualização está prevista para amanhã, 18 de outubro, dia do lançamento oficial.

Lindíssimo, narrativamente excepcional e emocionante são apenas alguns dos elogios que ele merece.

E, mesmo considerando que o ano ainda não acabou, e que diversos titãs serão lançados nesse último quarto, vai ser difícil A Plague Tale: Requiem não entrar na lista de melhores do ano de muita gente. Na minha ele já está. E, pelo menos por enquanto, talvez esteja liderando.

Cicatrizes - A Plague Tale: Requiem


A análise de A Plague Tale: Requiem foi escrita com base em uma cópia de review gentilmente cedida pela assessoria de imprensa do game. Disponível para PlayStation 5, PC, Xbox Series, Xbox Game Pass e Nintendo Switch (via cloud).

Papai Platina
(Pouco) conhecido como Willian. Marido, pai de três filhos maravilhosos, fã de Stephen King, filmes toscos e trophy hunter nas horas vagas. No Twitter como @papaiplatina e willianmarques na PSN.