Análise O Escudeiro Valente (PS5)

O Escudeiro Valente é uma aula de game design, criatividade e fofura que você não pode deixar passar.

O Escudeiro Valente

Desde que The Plucky Squire foi anunciado em 2022 no showcase da Devolver Digital o jogo chamou muito a minha atenção e eu mal podia esperar a hora de colocar as minhas mãos no que parecia uma preciosidade. Dois anos depois a espera terminou e, finalmente, tive a oportunidade de jogar O Escudeiro Valente — como o título foi adaptado para o Brasil — e fico muito feliz em dizer que o game superou em muito minhas expectativas.

Desenvolvido pela All Possible Futures e publicado pela Devolver, O Escudeiro Valente lança hoje, dia 17 de setembro de 2024, para PlayStation 5, Xbox Series X|S, Nintendo Switch e PC, e se você é assinante da PlayStation Plus Extra o jogo estará disponível como parte do catálogo de setembro sem custos adicionais.

Era uma vez um escudeiro chamado Pontinho

Durante esse review ainda vou rasgar muitos elogios para O Escudeiro Valente, mas o primeiro ponto que gostaria de destacar é que o jogo está totalmente localizado em português do Brasil e isso faz toda a diferença para tornar ele ainda mais acessível a públicos de todas as idades.

Todos os textos, menus, itens e nomes de personagens não só foram traduzidos como também adaptados para o nosso idioma de uma forma que denota um carinho e respeito excepcionais com o projeto. Além disso, a narração de O Escudeiro Valente contou com o trabalho inconfundível do ator e dublador Mauro Ramos, mais conhecido como a voz oficial do Shrek e do Sullivan de Monstros S.A. aqui no Brasil.

Violeta e Pontinho

Voltando a falar em públicos de todas as idades, acho importante deixar claro que o jogo mira em uma audiência ampla, mas é um título com uma pegada muito lúdica, para não dizer infantil.

Isso não quer dizer que jovens adultos, e até mesmo os velhos adultos, não possam se apaixonar pelas aventuras de Pontinho, Violeta, Batera, Barbaluar e Pipu contra as maquinações do nefasto feiticeiro Enfezaldo e seus capangas, mas fica evidente desde os primeiros minutos que a narrativa do game é muito leve, afinal é uma história saída — literalmente — de um livro infantil.

Talvez isso soe como um ponto negativo para o gamer mais hardcore, aquela galerinha que gosta de debater a dificuldade nos jogos, sabe!? Mas eu encarei O Escudeiro Valente como um convite para embarcar em uma aventura de fantasia e lembrar de uma época mais inocente — uma época em que meus maiores inimigos não eram os boletos — que fazia minha imaginação voar e que me transformavam no herói das minhas próprias histórias. E minha recomendação é que você faça o mesmo. Você vai se divertir muito mais assim.

O Escudeiro Valente

Em O Escudeiro Valente, Pontinho é o herói da nossa história e como todo herói destinado a coisas heroicas ele passará por diversas provações quando o maior inimigo do reino de Mana, o malvado Enfezaldo, descobre a metamagia e consegue com o uso dela causar caos, destruição e expulsar nosso protagonista do seu próprio livro e, com muita malvadeza e vilania infantis, criar uma narrativa em que ele é a estrela da história. Ainda bem que Pontinho é amado por todos e, com ajuda dos seus amigos e diversos outros personagens, ele buscará encontrar seu verdadeiro potencial para alcançar o final feliz desse livro.

É uma historinha simples e pueril mas, mesmo assim, se ela não te fisgar, a direção de arte do jogo vai!

O Escudeiro Valente

É impossível não ficar impressionado com a qualidade visual que a All Possible Futures alcançou com o seu primeiro lançamento. E ainda nem estou falando das mecânicas do jogo, da transição da jogabilidade 2D para o 3D (que é impressionante), estou me referindo apenas à arte de O Escudeiro Valente, que é simplesmente sensacional. Eu não ficava tão impressionado com uma direção artística e uma animação 2D desde Cuphead.

E embora esse seja o primeiro jogo do estúdio, os fundadores da All Possible Futures e diretores do game, James Turner e Jonathan Biddle, não são novatos na indústria de jogos.

Transições entre 2D e 3D

James foi designer gráfico de vários jogos da série Pokémon, como Pokémon Black e White, X e YSun e Moon e Pokémon Sword e Shield (atuando nesse como diretor de arte principal), inclusive sendo o primeiro artista ocidental a criar designs para os monstrinhos de bolso.

Já Jonathan é um velho conhecido (meu pelo menos) por ser fundador do estúdio indie Onebitbeyond e Diretor Criativo de The Swords of Ditto, um jogo que adoro e que considero quase um embrião visual para O Escudeiro Valente. Não acredita!? Veja esse vídeo do meu finado canal do YouTube e tire suas próprias conclusões.

E por que acho importante colocar esse tipo de informação aqui? Porque essa trajetória estelar culminou em um dos jogos mais bonitos, criativos e cheio de carisma de 2024, sendo um forte candidato a vencedor de jogo indie do ano não só em uma, mas aposto que, em várias premiações. Aguarde e confie.

O Arqueiro Valente?

Entretanto, mesmo que o visual do jogo seja o primeiro atrativo aos olhos, isso sozinho não seria suficiente para eu fazer afirmações tão contundentes. É na jogabilidade que ele brilha forte. Especificamente na transição entre a animação 2D das páginas do livro para o 3D do mundo “real” exterior e depois de volta ao livro. É impressionante, fluido e por que não, verdadeiramente mágico.

Outros jogos, como Super Mario Odyssey, The Legend of Zelda: A Link Between Worlds e Paper Mario: The Origami King combinam elementos de RPG 2D com exploração em 3D em pontos específicos, mas da forma e na extensão que foi feita aqui em O Escudeiro Valente, transformando essa alternância em sua mecânica principal, é formidavelmente original.

O Escudeiro Valente

Mesmo que o jogo seja direto, com poucas possibilidades de exploração de caminhos secundários, tentar descobrir áreas escondidas (elas existem) em que é possível sair do livro é muito convidativo e recompensador.

Além disso, essas transições servem muito bem aos quebra-cabeças do jogo. Diversas vezes é necessário sair do livro e explorar páginas anteriores ou o o quarto do garoto Sam a procura de itens que vão permitir ao jogador avançar na história.

É tudo muito orgânico e, como mencionado, mesmo que o jogo seja fácil — principalmente no combate —, esses puzzles dão um frescor extra a O Escudeiro Valente e resolvê-los exige um pouco de pensamento fora da casinha no momento em que mais opções e gadgets são adicionados à jogabilidade. Não quero estragar surpresas aqui, então não vou entrar em muitos detalhes sobre isso.

A importância da exploração

Outro ponto extremamente positivo são os vários mini games que remetem a outros jogos como Resogun, Crypt of the NecroDancer, Punch Out, Limbo e até Metal Gear.

Quero ressaltar que essas homenagens não são mudanças de gameplay enfiadas de qualquer forma na estrutura do jogo apenas para existirem ali sem propósito, esses mini games realmente contribuem para uma variação e quebra de ritmo da jogabilidade de forma fantástica e que não deixam o game cair na monotonia.

Durante as minhas 10 horas de jogatina sempre algo novo acontecia e o game nunca parou de me surpreender. De novo, sem muitos detalhes para que você possa aproveitar tudo que O Escudeiro Valente tem a oferecer sem ter sua experiência roubada de você — afinal não sou nenhum Enfezaldo.

Referências as Resogun e vários outros jogos

Voltando a falar em referências, em Ártia, capital de Mana, você encontrará diversos easter eggs homenageando pintores famosos como Picasso, Salvador Dalí, Van Gogh, René Magritte, M.C. Escher, Andy Warhol, Bansky, Frida Kahlo e outros, e apesar desse não ser um dos mini games citados, encontrar todos e o que eles estão referenciando é muito interessante.

Os detalhes do ambiente, estilo dos personagens e os seus diálogos são um bônus para quem conhece e gosta desses artistas, mas muito bem construídos até para quem vai ver ali só um personagem secundário. Tem para todos os gostos.

Cidade de Ártia

Vale a pena?

A resposta curta é: MUITO.

O Escudeiro Valente é um jogo que transborda coração, carisma e originalidade.

Em um mundo onde empresas investem milhares de milhões em jogos AAA sem alma — tanto que tiveram até que inventar os AAAA para justificar custos cada vez mais exorbitantes —, que muitas vezes só conseguem gerar vários AAAHHH! de decepção, é incrível e imprescindível que algo tão criativo como esse jogo exista.

E, mesmo sabendo desde o começo que esse livro teria um final feliz, o que mais quero agora é uma continuação, um volume dois, capítulos extras, seja lá o que for…

O Escudeiro Valente


A análise de O Escudeiro Valente foi escrita através de uma cópia de PlayStation 5 gentilmente cedida pela Devolver Digital.

Papai Platina
(Pouco) conhecido como Willian. Marido, pai de três filhos maravilhosos, fã de Stephen King, filmes toscos e trophy hunter nas horas vagas. No Twitter como @papaiplatina e willianmarques na PSN.