Análise Shadow Warrior 3 (PS4)
Shadow Warrior 3 é rápido, divertido, caótico e tem um senso de humor bastante duvidoso. Ou seja, um bom jogo para se desligar da realidade.
O mundo não sabia, mas em 92 quatro rapazes mudariam para sempre a história dos videogames.
John Carmack, John Romero, Tom Hall e Adrian Carmack, repensando conceitos do primitivo MIDI Maze, criaram as bases do que viria a ser conhecido como jogos de tiro em primeira pessoa com o lançamento de Wolfenstein 3D.
E, apesar do impacto do game ter sido enorme, ninguém poderia imaginar que, menos de um ano depois, esses quatro moleques abalariam de novo, dessa vez de forma cataclísmica, a indústria dos videogames com DOOM. Nada era igual a ele na época, e nada seria o mesmo depois dele.
Se hoje vivemos a era dos souls-like e rogue-like’s, os anos 90 foram marcados pela época dos DOOM-like, ou jogos estilo DOOM. E não foram poucos os que beberam da influência dos games da id Software, dentre eles Quake, Unreal Tournament, Duke Nukem, Blood e o primeiro Shadow Warrior.
Com o passar dos anos, os FPS apostaram cada vez mais em batalhas realistas, com games como Battlefield, Medal of Honor e a série Call of Duty dominando as vendas do gênero, e se distanciando da galhofa, rapidez, sanguinolência e humor, muitas vezes duvidoso, dos primeiros DOOM’s e seus clones.
E, apesar do modo zumbi dos COD’s ser um remanescente dessa vertente, jogos com esses conceitos se tornaram raros no início dos anos 2000.
Contudo, um revival do gênero, agora conhecido como Boomer Shooter e não mais DOOM-like, começou a surgir nos últimos anos, com os lançamentos da re-imaginação de Shadow Warrior (2013) pela Flying Wild Hog, e sua continuação Shadow Warrior 2 (2016), o reboot de DOOM (2016), diversos indies, dentre os quais BPM: Bullets Per Minute (2020), DOOM Eternal (2020), e agora Shadow Warrior 3.
Também desenvolvido pelos poloneses da Flying Wild Hog e publicado pela Devolver Digital, Shadow Warrior 3 conserva a jogabilidade frenética, explosiva e cheia de humor digno de um estudante da quinta série dos jogos anteriores, com a adição de elementos de verticalidade inspirados em Titanfall e DOOM Eternal.
De Titanfall, Shadow Warrior 3 herda a corrida na parede, utilizada para atravessar cenários e aumentar a mobilidade durante combates, além de um botão usado para deslizar também focado em trazer rapidez às lutas.
Já de DOOM Eternal ele aproveita ideias como o Gancho Engatador, usado nas partes de plataforma entre as arenas, mas que pode (e deve) ser utilizado tanto nas batalhas como para fugir delas; além da execução de inimigos através de uma mecânica chamada Aniquilação, que seria o equivalente às Glory Kills, de DOOM.
E essa inspiração que às vezes soa como uma cópia não é uma crítica, pense em quantos jogos utilizaram o combate derivado da série Batman Arkham nos últimos anos, ou como o estilo battle royale dominou (e afundou) alguns dos títulos recentes mais populares e você vai entender que inspiração muitas vezes pode não recriar a roda, mas sempre faz ela girar, para o bem ou para o mal.
Além disso, essas referências estão tão evidentes que o próprio game brinca sobre isso sempre que pode. E, mesmo que algumas vezes a auto-depreciação sirva para encobrir uma possível falta de originalidade, é difícil levar Shadow Warrior 3 a sério a esse ponto, principalmente porque ele mesmo não faz isso. Essas mecânicas deixaram ele mais divertido, mais dinâmico e isso me conquistou.
A história aqui começa de onde o segundo terminou, mas não se preocupe, caso não tenha jogado o anterior, esse início reconta os principais pontos que deixaram o mundo, e Lo Wang, na situação em que se encontra e dão o tom para que a aventura continue. É uma narrativa simples, mas que oferece a desculpa perfeita para o objetivo maior do jogo que é destroçar demônios das formas mais variadas e sangrentas possíveis.
A diversidade de armas e as possibilidades de melhorias que elas têm são muito boas, e cada ferramenta de matança tem sua função no meio do combate caótico e frenético de Shadow Warrior 3. Para melhorá-las ou para deixar Lo Wang mais forte, o jogador precisa coletar orbes, que estão escondidos em cada fase ou completar desafios, como matar X inimigos logo após correr em uma parede, e coisas do tipo. Simples, fácil de entender e eficaz.
Para complementar e forçar — no bom sentido — que o jogador experimente o arsenal disponível, novos inimigos são introduzidos a cada fase, e assim estratégias distintas precisam ser adotadas para lidar com eles quando o game começa a inserir vários tipos em uma mesma arena. Isso não chega a deixar o combate muito mais complexo, mas faz com que o jogador tenha que priorizar determinados inimigos para continuar com a vantagem. E acima de tudo, deixa tudo mais divertido e variado.
Inimigos abatidos com armas de longo alcance recuperam a vida de Lo Wang e os derrotados com a espada Rabo de Dragão deixam munição ao morrer. Como complemento, a mecânica de aniquilação é diferente para cada adversário, o que garante um ritmo bom ao combate já que derrotar cada um com esse finalizador concede um bônus quando executado.
Por exemplo, aniquilar um Kugutsu faz com que Wang arranque seu olho e possa usá-lo para congelar os demais inimigos em uma área por alguns segundos, já a aniquilação de um Shogai garante pontos de vida extras a Wang.
Um ponto positivo que gostaria de destacar é o fato da espada ter um botão dedicado a ela separado das outras armas, e por mais que os combos dela tenham sido simplificados, em comparação aos games anteriores, ainda é extremamente satisfatório fatiar yokais com ela. E, alternar instantaneamente entre ela logo após atirar em um grupo de inimigos com duas metralhadoras elétricas, por exemplo, é até mágico de tão fluido.
Para complementar essa dança da carnificina também é possível usar itens dos cenários como barris explosivos, elétricos ou congelantes para controle de multidões, além de armadilhas, abismos e partes destrutíveis que podem ser utilizados como vantagens táticas durante as arenas. E, embora a dificuldade do game não seja proibitiva, nas últimas fases o jogador precisa utilizar cada uma dessas cartas na manga para vencer.
Entretanto, Shadow Warrior 3 não é isento de problemas, e apesar de, na minha opinião, esses defeitos serem eclipsados pelas suas qualidades, eu não poderia deixar de mencioná-los.
O primeiro deles é que apesar dele ter cenários e detalhes muito bonitos, durante as cutscenes é aplicado um efeito de aberração cromática tão intenso que me incomodou bastante. As CG’s que, na maioria dos jogos, são mais bonitas que o gameplay, aqui são lavadas e sem a vivacidade de cores que o título tem.
O outro problema é a falta de peso e impacto nos golpes.
É ótimo destroçar o grande Gassy Obariyon, o inimigo com o design mais incrível do jogo, mas o impacto em matar ele e aniquilar um franzino Hattori é praticamente o mesmo. E isso se aplica as armas também, usar a Lança Shuriken e a granadeira Touro Vermelho, apesar de radicalmente diferentes nos seus efeitos e poder de fogo, tem o mesmo feedback de peso para o jogador.
Contudo, como mencionado acima, para mim esses problemas são mínimos frente às 8 horas de diversão que Shadow Warrior 3 me proporcionou.
E, embora o humor bobo e adolescente de Lo Wang não seja exatamente o mais refinado do mundo, o que talvez incomode algumas pessoas, eu saúdo a quinta série que existe nele, porque ele conversou com a quinta série que existe dentro de mim, e que sei que existe dentro de cada um de nós, não importando a idade.
Afinal, esses jogos não passaram a se chamar boomer shooters à toa. Ok, boomer!?
(Será que esse final ficou muito cringe? Se ficou, ótimo. Era essa a intenção.)
A análise de Shadow Warrior 3 foi escrita com base em uma cópia de review gentilmente cedida pela assessoria de imprensa do game. Também disponível para Xbox One e computadores.